O Velho do Restelo não é contra os Descobrimentos, mas contra a forma como foram levados a cabo pelos portugueses, resultado da reconhecida falta de capacidade de liderança, organização e planificação típica dos povos que não se governam, nem se deixam governar
Apesar de Camões ter colocado o Velho do Restelo no momento da partida da armada de Vasco da Gama para a Índia, a verdade é que a personagem do Velho do Restelo foi criada por Camões, 60 anos após a chegada de Vasco da Gama à Índia e trinta anos após a célebre carta de D. Afonso de Albuquerque ao rei D. Manuel I em que afirma que “as cousas são já despesa”.
É impossível não ver Camões naquele velho de aspecto venerando, que ficava nas praias, entre a gente, e que falava com a autoridade de um saber de experiências feito.
O Velho do Restelo não é contra os Descobrimentos, mas contra a forma como foram levados a cabo pelos portugueses, resultado da reconhecida falta de capacidade de liderança, organização e planificação típica dos povos que não se governam, nem se deixam governar. É o próprio Camões que, no final de Os Lusíadas, profundamente amargurado, é obrigado a dar razão à voz corrente na França, na Alemanha, na Itália e na Inglaterra de que os portugueses são melhores para ser mandados do que para mandar.
Aliás, o Velho do Restelo identifica, de imediato, a principal causa do fracasso económico dos Descobrimentos e que continua a ser hoje a principal causa da ruína económica das políticas dos sucessivos governos: a Ganância. E a verdade é que ainda hoje o povo néscio, ou seja, as pessoas ignorantes e estúpidas continuam a ser enganadas pelos chico-espertos com o mesmo tipo de balelas.
Camões, no final de Os Lusíadas, faz um apelo ao Rei para tomar “conselho só d’exprimentados / Que viram largos anos, largos meses, / Que, posto que em cientes muito cabe, / Mais em particular o experto sabe.” Ou seja, para tomar conselho dos Velhos do Restelo, a voz da razão, alicerçada num saber de experiências feito, e não nos Chico-Espertos do Restelo, movidos exclusivamente pela ganância e pela cobiça.
Mas, infelizmente, nem o Rei seguiu o seu conselho, nem os portugueses, que continuam a desdenhar da sabedoria dos Velhos do Restelo e a entregar os destinos do país a chico-espertos, movidos unicamente pela ganância e pela cobiça.